quinta-feira, 24 de junho de 2010

tranquila, apenas tocando a vida

não haveria calma longe daquele riso doce. eu não encontrei no mundo uma razão para voltar, não encontrei o conforto seguro e necessário para permanecer, não encontrei flores espalhadas no caminho mas isso não me fez desistir de seguir.

minhas perspectivas que nunca foram assim tão cheias de certezas, são cada vez mais infiéis, escapam de mim, me abandonam, se deixam trocar por uma outra qualquer cheia de possível felicidade que logo se dissolvem, mudam de forma, de cor e logo são outras, cada vez mais novas e cheias de vontade própria. meus anseios me fogem do controle.

um milhão de palavras e a inútil cobrança interna de fazê-las vivas. josé saramago morreu numa sexta-feira e eu chorei ouvindo beethoven, por me sentir a última pessoa do mundo a receber a nota do falecimento. meu consolo é um número de telefone que sempre me atende. sua pronta disposição desperta uma coisa boa no meu coração, mas não é por ela que eu o amo. eu nunca amei um número de telefone e acho que nunca amei número nenhum.

o que eu amo são beijos na testa. não sei por qual motivo eles me dão um sensação de aconchego, como quando abro a caixa de fotografias de minha mãe. todos nós estamos lá: irmãos, avós, sobrinhos, vizinhos, papai, primos e tios que eu não conheci. alguns cães também estão lá. os melhores passeios, natal e dia das mães que é quando a gente ainda se sente mais família.

eu ainda corro pela casa, ainda tenho gesso no braço. algo sempre insiste em me chamar de volta, alguma coisa que faltou viver. por vezes me inclino a desfiar nostalgias. um piano na sala e a 9º sinfonia que mal me recordo o primeiro acorde.

o presente, a realidade objetiva, o materialismo. beethoven era de sagitário. amanhã mais um de nós morrerá e não será saramago. ninguém morre duas vezes.