quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

ao meu velho e bom ano

cheguei completamente embriagada e você com tudo. se morresse naquele estado não sei o que me esperaria por trás das portas da percepção. depois de chorar por quase um dia sufocada e claustrofóbica, você me levou pra passear de barco. tudo contra a minha vontade, mas não se deixa uma amiga chorando sozinha. 

você acabava de chegar com o mar e foi me enchendo de calor e paz. 

que primeiro dia lindo você fez. 

não fosse pelo lixo. tinha todo aquele horrível lixo espalhado por toda parte. não foi como o lixo pelas ruas do recife, não era o mesmo lixo do carnaval no rio. sempre aceitei na vida o lixo no cenário urbano, sua circulação noturna, o vasculhar dos ratos. mas ali na natureza exuberante da mata atlântica, o lixo era a incômoda constatação do nosso fracasso. 

antes da sua partida, te sinto ainda presente e intenso, arrastando suas demandas, bagunçando os meus ciclos, me fazendo esquecer a ordem das luas. não te deixarei pra trás. você vem comigo um pouco mais. não vai dar pra começar um outro ano sem você, nessa lucidez plena e concreta com horário de almoço e janta.  

quando você me deixar seu último olhar, vou me permitir últimas e sinceras lágrimas. e enfim irei festejar.      

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

a dialética das coisas

existe uma parte minha que não desiste do que é utopia. esse horizonte pra onde caminho exausta, esse abismo de se sentir. busquei a racionalidade, mas ali não me senti suficientemente profunda. não o quanto me sinto numa roda de embriagues. 

rimos das suas memórias, ofendemos a sua patologia que tão pouco nos importa. eu choraria as dores do mundo sozinha mas eu quero uma dor mais coletiva. eu preciso chorar pelo mundo, chorar por você que mal se deixa levar pelos momentos, eu preciso ferir suas lembranças patéticas, memorias parciais. 

quero te beijar no rosto no meio da rua. quero a nossa entrega e achar graça, quiça até bonito quando nos perdemos e nos deixamos envolver por outras vozes, outras palavras, outras razões. para acreditar que a vida segue, que as decisões estão além da minha existência. se é que existo. 

quando as luzes me faltam busco a poesia. quando a poesia me falta regresso a dor. não busquei culpados porque fui alienada da habilidade de construir julgamentos. me é exaustivo, me falta retórica. 

existe uma luta. nela eu quero ser mais do que sou. vou construindo esse caminho. 

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

piu piu

tem gente que ainda chama o twitter de miniblog

terça-feira, 22 de setembro de 2015

vespertina

aproximo minha cadeira da janela para assim ser tocada pelo sol. não me incomoda o calor, troco os óculos, levanto a blusa e acendo um cigarro usando fósforos de uma caixa que encontrei esquecida numa gaveta. 

tem semanas que não fumo. não sei quantas, algumas, não conto o tempo. me deixo tomar pelo enjoo da fumaça, fecho os olhos, quero viajar, de careta não dá. me envolvo em meu silêncio, ao longe ouço os motores dos carros, ouço as árvores conversando. 

acaba o meu trago, o telefone toca. acaba a minha paz.  

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

quem dera que se cumprisse o desejo do meu coração

(jó 6:8)



aquele dia em que a bíblia tem mais poesia que a vida

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

eu prefiro assumir a minha fraqueza

do que mentir pra você.

sábado, 12 de setembro de 2015

o último gole

a luz da manhã me desperta mesmo com as janelas fechadas e nessas horas eu ainda te toco com desejo porque gosto do calor do teu sono.

sentamos num mesmo bar como se fosse a vez primeira. te conto uma história infame, argumento com pouca convicção e você ainda sorri um riso natural e melhora a minha retórica. você ainda bebe o meu último gole, aquele que mantenho por capricho no fundo do copo.

o copo em que se bebe nunca deve permanecer vazio. em mim transbordou.

sábado, 15 de agosto de 2015

eu não consigo ir

eu nunca tento fazer o que não me sinto seguramente capaz de realizar. dissertar, por exemplo, eu evito. tem mais de uma dezena de anos recebi um conselho: escrever alivia dores emocionais. também me disseram que para se escrever bem deve-se escrever todos os dias. não sei se são verdades, mas de fato eu gosto de escrever. mesmo sem nenhum talento, mesmo sem nenhuma bossa.

eu acreditei que manter essas palavras aqui já não fazia nenhum sentido, que não tenho mais idade nem tempo pra baboseiras sentimentais. eu errei. e me dei conta do meu erro tão logo o cometi. chorei.

dias passaram, escrevi mensagens em sms e enviei para mim mesma. lembrei meu primeiro blog, quase infantil, as poesias que ainda estão no recanto das letras, as pessoas de quem pude me aproximar pelo laço da escrita. então eu voltei mais uma vez a me ocupar desse canto meu, do meu modo particular e desinteressado. voltei.

terça-feira, 28 de julho de 2015

coração de passarinho

eu segurava a mão fria de vovó entre as flores postas, enquanto minha mãe foi pegar um café. nunca comi nada em cemitérios, tenho horror a lanchinhos fúnebres, não bebo nem água. nada. não me parece um bom lugar pra se fazer refeição e sabe, comida carrega energia. respirei fundo e engoli saliva, o que fez meu estômago revirar de fome e dor.

precisava sair dali. olhei uma última vez pra vó belinha, ela estava bonita apesar do algodão no nariz. eu amava suas rugas. quando criança gostava de criar caminhos pela pele já tracejada pela vida. a tia anita tinha passado até o perfume de alfazema nela. estava fofinha e cheirosa como sempre, pena a ausência de vida.

saí por uma porta de vidro lateral na qual precisei pedir licença a pessoas que nunca vi na vida, mas que deviam conhecer minha falecida avó. mirei as crianças que estavam ao redor de um banco e se comportavam com mais agitação do que a recomendada para a ocasião. me aproximei curiosa e pude ver um passarinho cinzento e muito pequeno acomodado nas mãos de gabriel. de olhos fechados e bico entreaberto, eu logo percebi que estava morto. 

larissa, a menorzinha, puxava para baixo a blusa do irmão, tentando enxergar acima de seu campo de visão. segurei a menina no colo e ela passou o dedo pela cabeça do bichinho. 

'e agora?' - perguntei

'tia, ele pode ficar com a vovó?'

'acho que sim'

voltamos para a sala onde as velas queimavam, misturando cheiro de parafina com o das flores que já murchavam. pedi que gabriel me passasse o passarinho. antes de me entregar, ele lhe deu um suave beijinho e a larissa, claro, também quis beijá-lo. acomodei-o entre as mãos de minha avó e quando fecharam o caixão, os dois ficaram juntos. 

já em casa, as crianças estavam exaustas. ajudei minha irmã com o banho deles e os colocamos pra dormir. o gabriel já sonolento me disse: 'tia, se a vovó ficar com medo, o passarinho pode cantar pra ela'. 

sorri e ele sorriu de volta com olhos tristes e meu estômago voltou a doer, porque eu estava apavorada e não havia quem pudesse cantar junto ao meu peito.  


segunda-feira, 8 de junho de 2015

órbitas dos planetas

olhar para o céu me faz lembrar. olhar com entusiasmo me faz querer.

alguém aponta o dedo pra um ponto qualquer: "é Vênus. chamam estrela da manhã, mas na verdade é um astro"

...

astros brilham?

alguns

domingo, 24 de maio de 2015

podofilia

concordamos que mal nenhum havia e nos deixamos ficar abraçados um bom tempo. era verão e o ar se movimentava tão quente quanto a respiração dele no meu ombro e eu que não queria chorar, olhei para baixo teus pés calçavam chinelos.

lembrei os desmaios, os primeiros delírios, a dúvida e a não gravidez. caí da cama, caminhei pela casa sem despertar, me recompensei e puni com intemperanças.

suportarei o peso de tentar viver assim. um ou outro reparo quiçá se fará necessário, mas nada que comprometa meus dentes bonitos.  

me olhou nos olhos, sorriu com os lábios beijáveis numa tarde morna. e só um pensamento me perturbava: meu deus, que pés horríveis.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

desde 2009

"você tá nova pra ter preguiça de aprender as coisas."




dizendo coisas que eu preciso ouvir

terça-feira, 21 de abril de 2015

é nessas horas mornas que a minha cabeça se perde de mim.

sexta-feira, 17 de abril de 2015

respiração

tem dias que passa e eu mal vejo.

se passo mal, troco as letras por companhia e a gente se perde. nesses dias sempre chove.

e se chove tudo para. eu fico puta da vida mas só suspiro, já quase não me queixo. mesmo se fui de chinelos, mesmo se o rádio insiste em trocar ideia. eu só suspiro.

to de férias da escola, mas preciso estudar.

eu de carro penso que sou um doce dentro dum vidro no balcão do bar. suspirei e sorri.

segunda-feira, 23 de março de 2015

só dizer meu nome

e aquela boca fica ainda mais bonita.

quinta-feira, 19 de março de 2015

minha senha é um palavrão. algo sujo e improfanável que você mal ousa dizer, por isso nunca me revelará. que triste. desse doce azedo você precisa viver pra provar. não está claro como convêm, é uma letra morta, numa palavra triste onde escondo meu lado atormentado. 

minha escrita é clara. e isso me soou um elogio. estou confiante em te enganar com palavras, mas não sei até onde irei. toda farsa uma hora se revela. então me fingirei de louca e tudo se acertará com meio litro de lágrimas. meus papéis (tão esperados) chegarão e ninguém vai se machucar. 

vestiu o pijama do egoísmo e foi se deitar. insone, mas adormeceu sem dificuldade.

quarta-feira, 4 de março de 2015

não foi engano

atendeu o telefone com voz de sono e despertou de surpresa quando percebeu que a voz do outro lado não era a do nome registrado no visor do celular. ele pediu desculpas porque tinha dúvidas sobre a conveniência da situação. ela mal ouviu, nunca pensava a respeito de coisas como essa.

não houve como controlar o tom rouco e carregado de antipatia. não conseguiria voltar a dormir. anotou o recado com as mãos vibrantes. adjetivá-las trêmulas não definiria o formigamento que lhe subia dos dedos. um endereço, um até lá. ainda conta os minutos e já passou da hora.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

ressaca de carnaval

minha mãe toda vida incentivou que eu participasse de retiros religiosos quando em tempo de carnaval. de quase criança que eu ainda era não me parecia uma obrigação, mas a coisa mais natural a se fazer nessa época. passava o ano novo e ela logo aparecia com um folheto com fotos de um lugar qualquer onde aparentemente qualquer jovenzinho cristão poderia se divertir.  

não serviu pra me salvar a alma. em alguns anos fiquei conhecida nos retiros como a garota da mala pesada. parei de frequentar depois que me descobriram traficando vinho e vodca em garrafas embrulhadas na minha toalha. confesso que não queria sair e por motivo de que  eu estava com 17 e nessa época já andava atrás de pica. o macho era católico, devoto. aprendi até o terço da nossa senhora da divina providencia. não teve jeito, eu mesma me crucifiquei por pecados pelos quais nunca senti culpa.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

bruxarias

ela tinha menos de dezoito e estava sentada numa mesa de bar na primeira vez que algo aconteceu. ele vestia uma camiseta surrada do subcomandante marcos, era magro, sério e tatuado. ela o olhou por toda uma tarde, sem que ele retribuísse ou ao mesmo demonstrasse perceber até que depois de tomar o último copo de cerveja em pé ele caminhou na direção de onde ela estava e acenou uma despedida e um meio sorriso. sobre a mesa pousou um pequeno cartão pessoal.  a irmã sentada ao lado tão boba quanto ela própria lhe alertou: cara, você é bruxa.  

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

planos

- oi bonito! já tem planos pro fim de semana?

- tenho. ficar com você.