terça-feira, 31 de março de 2009

fui eu...

'há algo errado no paraíso. é muito mais que contradição.
sou eu caindo num precipício e você passando num avião.
você me olhou, fez que não me viu. foi como se eu não estivesse ali
desligou a luz, deitou, dormiu. nem pensou em se divertir.

vai ver que a confusão fui eu quem fiz, fui eu...'

quinta-feira, 26 de março de 2009

quando me veio o medo

foi quando eu não esperava. não passava pelo pensamento sequer rastro. aconteceu nos primeiros dias do outono, quando os dias ainda são quentes, mas as manhãs e as noites são temperadas pelo vento noroeste. aquele mesmo que levanta as saias e brinca entre as pernas, que enlouquece com seu cantar constante, que seca, derruba e arrasta as folhas.

era outono. era tarde. o sol quase a se pôr. eles encontravam-se sentados. ombro com ombro. lado a lado. não se olhavam, mas conversavam sobre algo que eu não compreendia, pois estava com fones de ouvido. um aceno de cabeça em minha direção, uma sombra de sorriso nos meus lábios.

ele me veio. medo. me abraçou e seus braços eram frios. segurei a alça da bolsa, ele não poderia me levar dali. diminui o volume dos fones, a voz feminina dentro deles ia dizendo '... calendário que nunca chega ao fim...' mas se calou antes de completar a frase. então eu pude ouvir a voz dele: noite, pai, porta da cozinha. ou qualquer coisa assim.

o medo encostou a cabeça nos meus ombros e sorriu maudosamente quando me arrepiei com seu toque. eu disse não! o medo disse sim! foi então que eles se levantaram. ele. ela. caminharam de costas para mim. a luz que dançava no espaço entre os dois corpos se desfez, as mãos se tocaram, os corpos se juntaram e caminharam abraçados.

nessa hora o medo entrou pela minha boca, deu nó na minha garganta, desceu e me chutou o estômago por dentro: uma, duas, dez, mil vezes. depois ele se foi e me deixou como antes: só.

e embora toda a solidão que já senti na vida, nunca fui tão só quanto no momento que se seguiu. o abandono do medo e a certeza que ele não me esqueceu. que voltará. porque o medo sempre volta. e meu coração pesa no peito. um peso que sozinha eu não suporto carregar.

quinta-feira, 19 de março de 2009

eles sempre terão paris...

e nós sempre teremos casablanca





- todo homem, obrigatoriamente deve ser richard blane ou victor lazlo. agora, filho se um dia uma mulher disser que você é os dois, ela estará definitiva e eternamente apaixonada por você.

- mas pai, e se ela não tiver visto o filme?

- ela então o verá. e lhe dirá...

terça-feira, 17 de março de 2009

'faz tempo que a gente cultiva
a mais linda roseira que há
mas eis que chega a roda viva
e carrega a roseira pra lá...'

quinta-feira, 12 de março de 2009

pai, eu que te escrevi tantas coisas, assim só por distração. você sabe como eu me sinto ridícula por isso, mas é que por vezes me esqueço de lembrar das coisas que você me ensinou. de nunca me sentir sem valor, de sempre saber rir e fazer a vida mais leve. às vezes me abandona aquela sensação de alegria e liberdade de quando você me rodava e rodava, às vezes ela se vai de mim.

em você que eu nunca vi tristeza, mas que existia, hoje eu sei. mas sempre com sorrisos você me recebia, mesmo na última vez e você sabia bem que era a última. você sabia como ninguém. disse pra eu sempre cuidar das nossas plantas, mas eu não o fiz, pai. elas não tinham razão sem você. mas tatuei em mim a sua flor preferida.

espero que sempre me perdoe por eu ser essa filha toda errada, da qual você não sentiria nenhum orgulho, hoje. às vezes penso que é bom que não está aqui pra me ver... me perdoe por isso também.

não que eu sinta sua falta, mas nossa vida era tão mais fácil quando minha única preocupação era levar o xuxo pra passear e rir de você jogando ele no lago pra que ele nadasse todo molhado até onde estávamos. seria bom voltar.

não pense que estou te julgando, nunca faria assim. você soube ter coragem, chérrie! mais que qualquer outro. a vida sem você mudou tanto que não acredito mais que um dia a gente possa se abraçar de novo, quando eu me for desse mundo. mas também não duvido que aconteça.

águas de março

'é pau. é pedra. é o fim do caminho
é um resto de toco. é um pouco sozinho
é um caco de vidro. é a vida. é o sol
é a noite. é a morte. é um laço. é o anzol

é peroba do campo. é o nó da madeira
caingá, candeia. é o matita pereira
é madeira de vento, tombo da ribanceira
é o mistério profundo. é um queira ou não queira

é o vento ventando. é o fim da ladeira
é a viga. é o vão, festa da cumeeira
é a chuva chovendo. é conversa ribeira
das águas de março é o fim da canseira

é o pé. é o chão. é a marcha estradeira
passarinho na mão, pedra de atiradeira
é uma ave no céu. é uma ave no chão
é um regato. é uma fonte. é um pedaço de pão

é o fundo do poço. é o fim do caminho
no rosto o desgosto. é um pouco sozinho
é um estrepe. é um prego. é uma ponta. é um ponto
é um pingo pingando. é uma conta. é um conto

é um peixe. é um gesto. é uma prata brilhando
é a luz da manhã. é o tijolo chegando
é a lenha. é o dia. é o fim da picada
é a garrafa de cana, o estilhaço na estrada

é o projeto da casa. é o corpo na cama
é o carro enguiçado. é a lama, é a lama
é um passo. é uma ponte. é um sapo. é uma rã
é um resto de mato na luz da manhã

são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

é uma cobra. é um pau! é joão. é josé
é um espinho na mão. é um corte no pé

são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

é pau. é pedra. é o fim do caminho
é um resto de toco. é um pouco sozinho
é um passo. é uma ponte. é um sapo. é uma rã
é um belo horizonte. é uma febre terçã

são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração'

sexta-feira, 6 de março de 2009

no bar

ela sentada sobre os joelhos dele. os lábios se descolam e ela:

- você não beija de língua?

ele, com aqueles olhos de criança e cara de cansado:

- não gosto muito de beijos de língua!

não satisfeita com a resposta, ela:

- você é hetero?

e ele, com um meio sorriso, daqueles que faziam ela desejar que ele acordasse ao seu lado pra sempre:

- ah, eu sou no mínimo 'bi'!

ela, mentalmente: 'nada que eu não possa resolver...'

só restou aos lábios se colarem novamente.

quanto engano...